O MURO

 


De repente e sem aviso os dias esfriaram para tão logo se aquecerem como no Agosto que ainda mal tinha partido. No final das tardes gostava de se encostar ao velho muro de tijolo, esburacado, protector do vento fininho onde ele e as lagartixas ainda consumiam o quente deixado pelo Estio.
Ficava pensativo.
Queria guardar dentro de si tudo o que via adiante, mas mais que tudo o que cheirava, os perfumes únicos que etiquetava na sua cabeça a cada cousa que via sem abrir os olhos e descobria para grande espanto dos demais pela sua pequena idade.
Ficava pensativo e até um pouco triste de crescer.
Talvez esquecesse de tudo, afinal os adultos que conhecia não ligavam nada ao que era importante para ele, e realmente importante era lembrar o cheiro da manhã quando pisava na terra ainda húmida ou o cheiro barrento do muro onde agora se encostava para se proteger da brisa fresca de Setembro.
De repente ele cresceu e o nariz esqueceu-se dos cheiros que lhe eram tão importantes.
Mas quando lá regressava, ao velho muro de tijolos, cada vez mais decadente e pequeno, prometia a si mesmo não o esquecer. E era feliz apenas de se lembrar de si tão menino com pensamentos tão grandes.