TONS DA MEMÓRIA

 


 
Recordo-os. Ainda hoje me despertam como um beliscão, em qualquer lugar, se os pressinto de novo a passarem invisíveis, quase a desafiarem-me a memória na pergunta se os sei. Sei. Cada um deles, o seu travo, a forma como chegam mansa ou picante, deixando rasto ou simplesmente evaporando-se como se nunca tivessem existido. Sei de quem são, o que são e ao que me aportam. Há quem lhes chame memórias olfactivas, prefiro chamar-lhes a minha história, uma capa que me acompanha e cobre aquecendo nos dias em que sinto frio por dentro. E é tão libertador este aconchego que imagino estes aromas guardados em frascos abertos, sempre prontos ao encanto.
 
 

ALFAZEMAS DO LEMBRAR

 



Impressões da memória, tipografias a roxo como marcas em brasas que deixam viva a carne ferida e depois o tempo sopra no alivio da dor, crosta que cria, rebordo que moldura, cheiro que lembra.
Não esqueci.
Eu não esqueci o cheiro da alfazema, nem mesmo quando esboroada de seca esquecida entre páginas de livros arrumados ou porque as mãos apertaram aromas picantes em verde e o ardor dos momentos evaporou o significado do dizer.
Eu digo que não esqueci.
Porque alfazemas sempre serão alfazemas a perfumar a minha memória.